Uma tecnologia pioneira, que consegue inativar, num minuto, 99,97% das partículas de vírus SARS-CoV-2 no ar — e que chega aos 100% no espaço de cinco minutos –, acaba de ser desenvolvida em Portugal, foi hoje anunciado.
Anova tecnologia no combate à covid-19 foi criada no âmbito de um projeto liderado pelo Campus de Tecnologia e Inovação da BLC3, em Oliveira do Hospital, em parceria com a Universidade do Minho e as Faculdades de Farmácia das universidades de Lisboa e de Coimbra, disse hoje à agência Lusa o coordenador da investigação, João Nunes.
“Em um minuto, de 16.982 partículas de vírus SARS-CoV-2, numa amostra apenas cinco partículas não foram inativadas (‘mortas’, no senso comum), o que deu um resultado de 99,97%. E, ao fim de cinco e 15 minutos, obteve-se uma inatividade total, 100%, e sem qualquer variação no comportamento do vírus”, sublinha João Nunes.
O ensaio foi efetuado em 27 amostras diferentes, sendo “todos os resultados validados cientificamente”, acrescenta o investigador e presidente da associação BLC3.
Para o trabalho, foi igualmente importante o contributo de médicos do Centro de Saúde de Oliveira do Hospital, no interior do distrito de Coimbra.
Ao estudarem o comportamento do vírus, os investigadores concluíram que “um dos pontos mais fracos [do vírus], que não conseguiu evoluir ao longo de milhares de anos, foi a resistência à radiação solar”, refere João Nunes.
A tecnologia agora desenvolvida, denominada AT MicroProtect, baseia-se num “conceito novo de ‘física inversa’, que integra um sistema de emissão de comprimentos de ondas, de forma controlada e orientada, muito mais eficiente do que a radiação solar (novo princípio da mecânica de fluidos aplicado ao escoamento e propagação do vírus em termos aéreos), com o desenvolvimento de algoritmo matemático e físico sobre o comportamento do vírus”, explicita.
O equipamento não recorre ao uso de químicos e apenas precisa de energia elétrica.
“Uma das formas mais perigosas e menos controláveis” de o vírus que está na origem da pandemia da covid-19 (SARS-CoV-2) se transmitir entre as pessoas é pelo ar.
A tecnologia deve, assim, sustenta João Nunes, ser aplicada prioritariamente na proteção dos profissionais do setor da saúde, nos meios de transportes aéreos e terrestres e no interior de edifícios ocupados por um elevado número de pessoas, como aeroportos e centros comerciais ou lares de idosos.
Mas “também é possível aplicar à hotelaria e restauração e outros locais com o problema de qualidade do ar interior”, destaca ainda o cientista, adiantando que também foram desenvolvidos “um sistema e câmara de proteção entre profissionais de saúde e utentes”, e um modelo de criação de “zonas de antecâmara nos hospitais para a realização mais segura do processo de tiragem”.
O projeto já está, entretanto, a avançar na aplicação da tecnologia a outros vírus e bactérias multirresistentes.
A Organização Mundial de Saúde alertou recentemente para os perigos da transmissão por via aérea do novo coronavírus, mas isso, frisa, já faz parte da preocupação do consórcio liderado pela BLC3 “desde o início da pandemia” — o projeto AT MicroProtect nasceu em 14 de março.
Em três semanas, foi desenvolvido o conhecimento e tecnologia, tendo sido depois necessário algum tempo para aceder a estirpes do vírus SARS-CoV-2 isoladas e certificadas, para validar cientificamente todo o processo, relata João Nunes.
Para isso, foi muito importante o apoio do laboratório norte-americano que também fornece amostras de vírus para o desenvolvimento de vacinas a nível mundial.
O consórcio teve acesso a uma estirpe isolada de Hong Kong (início da pandemia), outra dos EUA (fase final) e uma terceira de Itália (fase intermédia), esta em colaboração com uma universidade deste país.
“O vírus por si só não tem inteligência e nós, os humanos, temos inteligência e conhecimento e estas são as melhores armas que podemos usar contra ele”, afirma João Nunes, defendendo que “não se pode esperar só por uma resposta de vacinas e medicamentos perante uma situação de vírus aéreos”.
Os resultados comerciais da tecnologia serão “aplicados para a investigação”, acrescenta.
“Temos de aprender a estar preparados de outra forma, temos de ganhar capacidade rápida de agir”, tanto mais que “ainda não é certo quando existirá vacina”, realça o investigador, apontando este trabalho como um exemplo no setor da saúde em formato multidisciplinar (envolveu conhecimento das áreas da engenharia mecânica, da física, da microbiologia e da virologia).
“Hoje, temos um conhecimento científico de base muito aprofundado sobre o comportamento deste vírus”, que permitirá, destaca João Nunes, “o desenvolvimento de mais tecnologia e conhecimento e expandir aplicação a outros vírus e bactérias alvo de interesse para a segurança e saúde pública”.